sexta-feira, 5 de março de 2010

Efeito Borboleta III

Descansando de Efeitos Borboleta materiais devolvo-me à essência do que procuro. E a minha flexibilidade lesionada de costas é suficiente. Faço a ponte para a história do Naftal. Não há números de conta, nem dinheiro, nem papel, há trocas de saber e um chegar mais além.
Entrem no ecrã do computador e transformem as letras em imagens. E vejam, ouçam, sintam este professor de Língua Portuguesa numa escola cor de terra no Chimundo, com um bloco de papel debaixo do braço a dirigir-se para a sala de aula. Dentro de si leva sonhos e experiências de vida, por fora… aquele caderno. É para lá que me viro. Ainda não há biblioteca nesta escola secundária (embora já paire uma esperança), não há livros para todos os professores e ultrapassa-me como se inventam para ensinar. Nesta história não se fala em bê-a-bás ou de primeiras escritas mas de uma 10ª classe. Hoje é o único material que têm.
E é deixando isso em aberto que passo para o seu interior:
Não se queixa. E isso impressiona-me. Já tinha reparado nas minhas viagens de chapa que ninguém se queixa. Às vezes apetece-me espetar um cotovelo europeu num ombro que me invade, ou empurrar, ser rude, gritar que desviem os joelhos das minhas costas, que claro que não podem pôr sacos no meu colo, não, nem sentarem-se ao meu colo! Está bem, uma criança e um saco, ou uma perna… mas só porque olho para o lado. E não há mesmo espaço e estão todos assim e ninguém se queixa.
O que vos quero dizer é que este silêncio não deixa de envolver sonhos. O Naftal tem os mesmos que eu ou qualquer pessoa dentro daqueles chapas. Não refilam, não entendo porquê, talvez saibam que não vale a pena e isso só os tornaria infelizes.
- Eu tenho sorte. Tenho alguns livros que me ofereceram que posso ler antes das aulas.
(tens sorte porque dás um valor sem fim ao que tens e não deixas por isso de querer mais – mas só penso)
Conheço o Naftal desde que cheguei. E além de ser uma pessoa que consegue ver sempre um lado bom, e que me ensina o que nem imagina, trabalha e estuda e pensa e quer.
Está a acabar um trabalho para finalizar o curso e poder candidatar-se a uma bolsa de um ano para estudar Literatura ou Língua Portuguesa em Portugal. E curiosamente é pelo Instituto Camões, “lugar” que me envolve em ternura.
Mas esses são alguns dos seus sonhos. O hoje, que é mesmo agora, é o caminho para a escola, aquela que é cor de terra, com um caderno debaixo do braço.
O que proponho, e porque ao longo dos anos conheci tantas escolas e tantos professores, alguns excelentes pessoas que, por acaso e de certeza por engano, em vez de Educação Física escolheram Português (há piadas que me são irresistíveis!), é que professores de Língua Portuguesa entrem em contacto com o Naftal, lhe enviem por mail algum conhecimento, fichas, material, conversa, não se esqueçam que a ligação à net é muito lenta, nada de vídeos ou de programas pesados...
É que ao perguntar-lhe de fugida se gostava que professores de Português, de Portugal, se correspondessem com ele ouvi um claro tão claro que me transformei imediatamente neste arco. Tem a forma de ponte… apenas feito de outras arquitecturas.
Às vezes uma simples troca do que se sabe pode fazer a diferença. Talvez se surpreendam.

(Facultarei o mail do Naftal aos interessados neste projecto. Dar pode ser muito fácil. Às vezes pode ser só não nos esquecermos que temos sempre o nosso tempo)









11 comentários:

  1. Minha querida sobrinha, que pena não ser professora de Português...
    Mas tenho a certeza que vão aparecer muitos que possam ajudar o Naftal
    Como é bom encontrar pessoas que querem aprendar sempre mais.
    Viva o Naftal !
    Beijinhos

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  2. Conheci este blog através de uma leitora do meu Rochedo. Em boa hora segui o conselho da Vera. Tudo o que li por aqui me empolgou e fez recuar 30 anos para um rewind do meu percurso. A descoberta do mundo levou-me a trilhar caminhos muito comuns aos seus, embora noutro continente. Um dia desta semana, este será o blog eleito para minha rubrica "Blogs no Feminino".
    Faço votos para que esses três meses em Moçambique lhe fiquem para sempre gravados na memória e lhe sirvam para a enriquecer ainda mais.
    Já fui feliz em Moçambique e aí voltarei lá mais para o fim do ano, para conhecer os meus afilhados.
    Tudo de bom para si.

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  3. Prima! Já estou a pensar em todos os professores de Português da minha escola (então os de PLNM - Português Língua Não Materna) e amigos que vão adorar poder ajudar e aprender com o Naftal! Depois ponho-vos em contacto! Adoro-te e orgulho-me sempre mais :)
    Beijinho muitoooo grande!!

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  4. Tão fácil, tão fácil. Tenho a certeza que essa troca de conhecimentos entre professores de português será benéfica para ambas as partes,
    daí surgirão muitos conhecimentos novos e
    trocas de experiências maravilhosas.
    Professores de Português, de Portugal, metam mãos à obra !
    Eu faço daqui a minha parte... Agradeço-vos!!
    Mãe de uma ponte maravilhosa

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  5. Em Cabo Verde viajei inúmeras vezes em "Iace", sempre com galinhas ao colo (e seus presentes) e patas felpudinhas a aquecerem-me os tornozelos. Até cheguei a experimentar cachupa que me foi oferecida numa dessas viagens. E que boa que é!!!
    Venho menos vezes aqui pq já estou em repouso em casa (quase 8 meses de Clara e Margarida) com um barrigão. Mas põe-me em lista de espera para poder contribuir (envia-me mail).
    Muitos beijinhos e um xi

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  6. Céu:
    Só não publico o mail do Naftal para não lhe encher a caixa de mails quando sei que não tem um acesso à net assim tão fácil! Mas nunca se sabe, minha tia, nunca se sabe se não lhe poderás escrever...
    Muitos beijos

    Carlos:
    Neste espaço tratamo-nos por tu, pode ser?
    Adorei o que li no teu Rochedo e ainda só por lá passei num tiro diagonal. Um orgulho ter sido eleita para a tua futura rubrica!
    Sabes, sobre esta experiência de Moçambique... hoje disse a uma pessoa que me é muito querida que sairei de cá com o coração partido. A diferença é que estará partido... mas muito maior.
    Obrigada pelo teu comentário!
    (Cinema paraíso é também um dos meus filmes preferidos. E escritores sul americanos... bem, não tenho espaço aqui para descrever como me encaixam!)

    Inês:
    Obrigada, prima! Fico à espera!
    Muitos beijooooos

    Madresita:
    Que facciosa... eheheh!
    beijos grandes

    Quita:
    Por aqui desde galinhas a bodes já me viajaram nos pés... mas não é isso que retenho, é a enorme vida que existe dentro daqueles chapas e que me passa quase por osmose...
    Já estás em espera, minha amiga! Só mais uns dias!
    (como te disse não consigo evitar emoção sempre que me lembro que uma das tuas filhas se chamará Clara...)
    Um beijo gigante (do tamanho da tua barrigona!)

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  7. ooops... professores de português... acho que tive uma vez uma senhora durante meio ano que ensinava português... depois desapareceu, parece que estimulava os alunos a serem criativos ou coisa assim, nada que fosse recomendável... bem sei que isso já foi há muito tempo, mas é curioso, não me lembro de ter alguma vez ouvido alguém falar com entusiasmo das aulas de Português...

    ...está-me a ocorrer que talvez o Naftal nos possa ensinar alguma coisa sobre o encanto da linguagem...

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  8. Alf:
    Passam-nos pela vida bons e maus professores. Como bons e maus médicos, bons e maus canalizadores, advogados, dentistas, músicos, escritores, inventores. No fundo, despindo a profissão, somos apenas pessoas. E felizmente encontram-se por aí umas geniais. Algumas escolheram ser professores de Português. (Excepto os professores de Educação Física! Somos a nata da nata da sociedade! ehehe!)
    Criatividade é definitivamente o que acredito que deve ser estimulado na Escola. Ensinar a querer pensar, a criar, a descobrir... Talvez por isso ande tão encostada ao desencanto.
    Muitos beijos!

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  9. Clara eu ando farto de ser professor de Educação Física em Portugal :)

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  10. Viagens Lacoste:
    Tens bom remédio...
    (ehehe!)
    A mim o que me desencanta é a noção de Escola, o que se pretende com a Escola... e como não consegui que mudasse mudei-me eu. E acredita que não é uma desistência.
    Vá, anda viajar!

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  11. Passado imenso tempo, apesar de para mim ter passado a correr e com imensos obstáculos e peripécias, consegui hoje dedicar um tempinho... também precisava de procurar algo de bom para o meu espírito.

    Em relação a este post, caso queira facultar-me o mail, acredito que a minha stora não se importaria de entrar em contacto com esse senhor. Pelo menos, eu ao divulgar-lhe o projecto, mal não faz.
    Beijinhos*
    Melina

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