Cajueiros numa Machamba do Chimundo (Fotografia tirada às pressas. Ainda não tiro fotos às pessoas. Porque... não.)
Tenho enviado as minhas histórias por mail em vez de actualizar o blogue. Mas desta vez apetece-me este caminho.
Para quem não sabe, estou a viver no Chibuto e a trabalhar no Chimundo. É longe e desloco-me de bicicleta. Está muito calor, há subidas e terra solta. É duro. Após cada viagem demoro uma hora a tornar-me decente. Quase derrapo no meu suor que se transforma em piscina olímpica em dois minutos e meio. Se não fossem as aulas de Natação do Francisco Alves temia pela própria vida. Mas ontem… ontem foi diferente…
Fiz o caminho de Bicla para lá e para cá. E... gostei.
Veio cá a casa, lanchar água, um professor Moçambicano. Quando lhe falei do meu sentimento em relação ao caminho senti-lhe uma pausa.
...
...
...
e disse-me:
- Vais chocar com o sobressalto.
(merda... não percebi, é uma frase linda mas não percebi. Como vou tentar esclarecer? Uma boa técnica é repeti-la. Tento.)
- Vou chocar com o sobressalto?
- Sim. Quando pensas em sofrimento, vais, pelo menos, tropeçar no sobressalto.
E conversámos sobre como poderia enfrentar o caminho diário de bicicleta.
Posso pensar que nessa altura, enquanto pedalo, ninguém me pode interromper, posso pensar naquilo que mais gosto, aproveitar o cheiro, ir sentindo o ambiente. Foi o que fiz. Seguindo as palavras de alguém que de Moçambique, além desta terra, só conhece Maputo, que todos os dias anda uma hora para ir dar aulas e que nem imagino o sofrimento por que já passou.
O N. tem 25 anos.
No dia seguinte, no caminho para lá, sozinha comigo, vivi uma das melhores experiências da minha vida:
Não houve uma única pessoa que não me dissesse Bom Dia. Desde Chibuto ao Chimundo, por alcatrão e por terra, com calor e dificuldade, estive SEMPRE acompanhada pela força do desejo daquelas pessoas. E foi o que decidi ter, naquele momento, decidi que iria ter um Bom Dia.
Ao início apenas sorria, depois já gritava um belo Bom Dia. Mas depois comecei a acenar, só uma mão no guiador... estrada de areia… muitas vezes quase a perder o controlo... BOM DIA!... Ups... duas mãos de volta ao guiador e aos acenos de sorrisos.
Sim… esta terra ainda tem paraísos.
Para quem não sabe, estou a viver no Chibuto e a trabalhar no Chimundo. É longe e desloco-me de bicicleta. Está muito calor, há subidas e terra solta. É duro. Após cada viagem demoro uma hora a tornar-me decente. Quase derrapo no meu suor que se transforma em piscina olímpica em dois minutos e meio. Se não fossem as aulas de Natação do Francisco Alves temia pela própria vida. Mas ontem… ontem foi diferente…
Fiz o caminho de Bicla para lá e para cá. E... gostei.
Veio cá a casa, lanchar água, um professor Moçambicano. Quando lhe falei do meu sentimento em relação ao caminho senti-lhe uma pausa.
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e disse-me:
- Vais chocar com o sobressalto.
(merda... não percebi, é uma frase linda mas não percebi. Como vou tentar esclarecer? Uma boa técnica é repeti-la. Tento.)
- Vou chocar com o sobressalto?
- Sim. Quando pensas em sofrimento, vais, pelo menos, tropeçar no sobressalto.
E conversámos sobre como poderia enfrentar o caminho diário de bicicleta.
Posso pensar que nessa altura, enquanto pedalo, ninguém me pode interromper, posso pensar naquilo que mais gosto, aproveitar o cheiro, ir sentindo o ambiente. Foi o que fiz. Seguindo as palavras de alguém que de Moçambique, além desta terra, só conhece Maputo, que todos os dias anda uma hora para ir dar aulas e que nem imagino o sofrimento por que já passou.
O N. tem 25 anos.
No dia seguinte, no caminho para lá, sozinha comigo, vivi uma das melhores experiências da minha vida:
Não houve uma única pessoa que não me dissesse Bom Dia. Desde Chibuto ao Chimundo, por alcatrão e por terra, com calor e dificuldade, estive SEMPRE acompanhada pela força do desejo daquelas pessoas. E foi o que decidi ter, naquele momento, decidi que iria ter um Bom Dia.
Ao início apenas sorria, depois já gritava um belo Bom Dia. Mas depois comecei a acenar, só uma mão no guiador... estrada de areia… muitas vezes quase a perder o controlo... BOM DIA!... Ups... duas mãos de volta ao guiador e aos acenos de sorrisos.
Sim… esta terra ainda tem paraísos.
Só tu,... e mais não digo
ResponderEliminar:)
ResponderEliminarMinha querida borboleta, a mim parece-me que essa terra só tem paraísos...
ResponderEliminarConheci, ano passado, o GRANDE Mia Couto, um moçambicano maningue cool, que usa as palavras como se fossem pérolas, cada uma com sua beleza própria e depois de pegar nelas, lapida-as à sua maneira, muitas vezes transmuta-as de tal forma, que pensamos ter chegado a um mundo totalmente novo onde ainda se inventam palavras...
Isto para te dizer que chocar com o sobressalto, é uma frase cheia de imagens (recordas-te da dificuldade de transmitir imagens por palavras?)
A mim parece-me que em África só se fala por imagens e eu adorava poder estar aí, só para ver ouvir essas imagens e sentir, como tu, que um BOM DIA, somos nós que o fazemos!
Um beijo grande
Patrícia
Não podia ir-me deitar sem vir ver o que tinhas para nos dizer.
ResponderEliminarBoa noite e um bom dia para ti amanhã...
Beijinhos
Teesa MF
Há pessoas para quem a Vida se passa sempre no mesmo sítio; a essas, esta história pouco dirá. Há pessoas para quem a Vida é uma viagem; para estas, a tua viagem de bicicleta é a mais bela parábola da viagem de uma Vida.
ResponderEliminar"estou a viver no Chibuto e a trabalhar no Chimundo."
ResponderEliminarNão consigo deixar de rir sempre que leio esta frase. Tem piáda, ou então acho piáda a pouco :)
Mais um bom dia!
Beijinho grande, Melina
Céu:
ResponderEliminarSer lacónico pode ser genial!
Marta:
Ontem lá tive que faltar ao nosso jantar... :)
Patrícia:
Se tivesse conhecido o N. na altura dos LECs, tínhamos sido as melhores alunas do Carmelo! "Chocar com o sobressalto"... que inspiração.
Teresa:
Espero que tenhas dormido muito bem!! (estou a ter cuidado comigo, não te preocupes, MF!)
Beijinhos
Alf:
Não desanimes por pedalares sem chegar a lado algum... já viste o que se encontra pelo caminho?
(Parabéns, querido amigo! Acertei em cheio apenas por feeling)
Melina:
Quando tiver um tempinho envio-te uns nomes próprios por mail... lindo!
a propósito de «chocar com o sobressalto» .. o Heiddegger disse qq coisa acerca de a nossa civilização assentar na luta contra o imprevisto, eliminar todos os imprevistos... só que sem imprevistos a vida perde o sentido, a utilidade, extingue-se, apaga-se; são os imprevistos, os sobressaltos, a força da vida.
ResponderEliminaré por isso que viajamos, não é, para «chocarmos com o sobressalto»? para sairmos do já conhecido, do já previsto.
é por isso que não é possível definir «paraíso» porque qq definição elimina o «sobressalto» e sem ele o paraíso não passa de um aborrecimento enorme.
é por isso que «chocar com o sobressalto» é tão importante. Aprender a chocar com o sobressalto em vez de fugir dele.
Por onde começar....primeiro a historia é linda, a frase que escolheste é ainda mais linda...tu és linda e vais ter nesse paraiso muitos lindos dias.
ResponderEliminarParabens.
Experimenta encher os pulmões e sentir um grande Hoyo-Hoyo!!!! Vais ver a diferença. É mais que Bom dia!! É mais que Olá!! É mesmo um "Benvinda!!!"
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